quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Na esplanada do Majestic

Três de Novembro de dois mil e dez. Em alemão as datas são só uma palavra.
Café Majestic, Porto. Acabaram de me trazer o lanche, cheira bem demais para continuar a escrever. Hm, ocorre-me agora que o cheiro bom é das castanhas que estão a vender aqui à frente.
(..)
São quatro menos dez da tarde. Adorei o meu lanche de chá de menta e croissants com compota de pêssego. Acabei de almoçar às duas, agora imagina o quanto ia gostar disto se tivesse fome.
Vim do metro logo para aqui porque queria começar a escrever "as ideias que vão mudar o mundo" mas, lembrando-me que ainda tenho de ir à Fnac, vejo que fiz a escolha errada, porque o que eu queria agora era ficar aqui sentada sem compromissos. E o tanto que eu tenho de estudar...
Ao meu lado sentam-se dois espanhóis.
Quem me dera ser estrangeira nesta cidade. Ou melhor, estar numa cidade estrangeira. Assim não teria de pôr óculos escuros nesta zona de sombra avassaladora, nem esta boina que, como qualquer outra, faz a minha cabeça esquisita...
E se eu desistisse de medicina e fosse para artes, só para poder ter uma razão para ser uma freak? Ser de artes é a melhor desculpa para ser freak...
Qual é a cena deste sítio, anyway? Os bancos são desconfortáveis, muito embora seja agradável virem duas pessoas servir-nos... A moeda de um euro de troco nem sequer é portuguesa. Pior, é espanhola... Não teria sido melhor percorrer a rua a comer umas "quentes e boas" que tão bem cheiravam há bocadinho?
As pessoas passam e tiram fotografias. "Agora tu", e trocam de lugar - a fotógrafa passa a fotografada e vice-versa.
Uma mulher de mangas cavas e chupa-chupa cruza-se com outra de gorro e cachecol. Que mundo é este? Que pessoas são estas? Que pessoa é esta que está aqui à sombra de óculos de sol, pretendendo ser estrangeira numa cidade que diz conhecer?
Um branco e um preto abraçam-se, velhos. Ou dão um velho abraço (deixa-me cá introduzir umas figuras de estilo). Pode ser um comentário racista mas não deixa de ser bonito.
Sabem aquilo de grupos de chineses que passam com máquinas ao pescoço? Claramente não é só nos filmes que acontece... Juro que se alguém vier falar comigo lhe respondo "what?". Ou então "quoi?".
Passa gente do ICBAS trajada. Espero que não me conheçam, agora estou estrangeira.
Um dos espanhóis faz as sombrancelhas e usa maquilagem.
O Majestic não vende tabaco. Não fui eu que perguntei, Mãe. Eu, a fumar, só cachimbo.
A mulher das cavas devia ser estrangeira. Todas as pessoas que por aqui passam descascadas são estrangeiras.
Um carro da polícia passa e um velhote pára e faz-lhe continência.
De repente apetece-me ter alguém com quem falar para comentarmos estas coisas; as folhas parvas deste caderno não me respondem. Isto não é nenhum diário de Riddle. Não volto a vir lanchar comigo, estou vinte e quatro horas comigo todos os dias, cansei-me de mim. Ainda que agora esteja estrangeira, no fundo sou a mesma. Vou à Fnac chorar um bocadinho em frente à prateleira dos Friends por faltar tanto para o Natal.
E, como agora estou estrangeira, até vou deixar o euro espanhol de gorjeta.

2 comentários:

Júlio disse...

Das melhores coisas que li nos últimos tempos. Não ando comentador e fizeste-me quebrar o silêncio. Obrigado por todas as imagens.

A mais velha disse...

gostei :)

eih g'anda indirecta para mim, no fim!